Ai de ti, princesa!
Ponta Grossa – Princesa dos Campos Gerais, capital cívica do Paraná – onde sou jogado nesta passagem terrena, mais outra, na minha mente é uma plebéia muito da distante, sim senhor, até porque ela toda vez me adiciona, até hoje, uma nova partida à minha mente. Quer dizer, para ser bem sincero, acontece sempre. Pois então troquemos esta minha indecifrável vida em miúdo.
1944
Sete da manhã, na Estação da Saudade toca a música – sempre a mesma – e dela sai o trem.
Nele está, à janela, o soldado Bernardo Mamcasz, dezoito anos de idade, a caminho da Segunda Guerra para antes ver o mar e sentir a vida no Rio de Janeiro.
Na plataforma, a moça dele, Leonor Makowsky, muito bonita, por sinal, com os cabelos presos ao sobressalto.
Nos lábios dela, vislumbra-se a doce lembrança de que, finda a batalha na Itália, ele alimente o sonho que passe ao fato do qual advenham pedaços de mim e dos futuros filhos da luta – meus irmãos, sobrinhos, netos, bisnetos e tataratantos.
1948
O bem-dito presente no ventre da foto acima, da moça Lola – Leonor Makowsky, muito bonita, por sinal, cabelos presos ao sobressalto, fruto gerado no sonho na Estação da Saudade, na Princesa dos Campos Gerais, Paraná, Sul do Brasil, a caminho da Segunda Guerra Mundial, na Itália, pois bem, talvez não, ei-lo no ventre, um menino, ou seja, eu, ei-lo, quer dizer, eis-me, melhor dito, Ecce Homo, diz Pôncio entregando o Cristo às feras deste mundo – obrigado, sacana Pilatos :
1959
Sete da manhã, na estação toca a música – sempre a mesma – e dela sai o trem.
Nele, eu, coroinha Eduardo Mamcasz, dez anos de idade, a caminho do seminário dos padres capuchinhos, Riozinho, Paraná, de onde sei que não há volta para mim e nem para as roupas que adentram o saco de cimento, de papelão, quase vazio de conteúdo, minha primeira das muitas bagagens desfeitas nesta vida.
Na plataforma, minha mãe, ainda bonita, cabelos presos ao sobressalto, coloca o olhar na frente do vagão até ser por ele atropelado na lembrança, dela e minha, minha vida, ainda sempre a sinto colocando a pétala de jasmim no bolso de minha camisa antes do caminho para a escola primária vicentina. Por isso, deleto meus pés descalços na relva da geada.
Minha mãe ainda é, até hoje, mesmo passada a outro nível há 35 anos, a mesma moça com os cabelos presos ao sobressalto, nos lábios os resquícios de uma antiga vontade de que, finda a batalha na Itália, ela alimente o sonho que passe ao fato de que advenham pedaços de mim e dos futuros filhos da luta – meus irmãos, sobrinhos, netos, bisnetos e tataratantos.
1968
Sete da manhã, na estação toca a música – sempre a mesma – e dela sai o trem.
Nele, o soldado 398, a partir de agora só Mamcasz, dezoito anos de idade, que nem o pai, circunspecto nas esperanças, a caminho do compulsório serviço militar, e através dele eu vejo o mar e sinto a plena vida no Rio de Janeiro.
Mas desta vez, na plataforma, com os cabelos em sobressalto, não há ninguém … nem a mãe, não mais jovem nem bela, câncer no útero, onde fomos gerados, eu, meus irmãos, sobrinhos, netos, bisnetos e tataratantos.
Pior ainda porque, desta vez, ao contrário do meu pai, na Estação da Saudade, ao tocar a música – sempre a mesma, no lugar da jovem bela, minha mãe, inexiste até a minha primeira namorada com quem possa dividir, então, na mente, os acordes iniciais do Tema de Lara do Doutor Jivago, que nos embalara poucas horas havia dantes.
E dentro do saco de lona verde, no lugar daquele de cimento, dos dez anos de idade, para que não se lance ao vento, eu me amarro na última promessa, sussurrada fundo à Perpétua do Socorro :
– Minha Nossa Senhora, faça com que eu nunca mais veja esta princesa e muito menos os campos gerais.
Na minha lembrança, resta agora, e desde o sempre, apenas esta
pequena, serena e sensível a espinhos –
É uma bola especial.
No ventre dela, sinto-me ainda guardado, ela bela, cabelos presos ao sobressalto,
Moça – minha mãe, ainda bonita …
Nos lábios, a doce lembrança de que,
Finda a Batalha da Itália,
Ela realmente no sonho
Que passe ao fato
De que advenham pedaços de mim
E dos futuros filhos da luta –
meus irmãos, sobrinhos, netos, bisnetos e tataratantos.
Mal sei eu, em segunda ida,
Que o fruto no ventre depositado
é a minha vida –
Saída, vívida e vivida,
Subida e descida,
– Sofrida?
Só sei que é sempre uma bola a rolar em direção ao banhado da Princesa dos Campos Gerais.
Mas era uma vez em que me torno, eu mesmo, um
Pequeno e sereno menino sensível a novos caminhos.
Recomecemos, então,
Tudo ao vento –
Na verdade, tem tanto tempo, tonto risco, que quase re-capitulo:
*
Eu e a bola
Sensível a espinhos
Mas no meu pensamento
Tem a casa – Rua Barão de Ramalho, 479, Uvaranas, Ponta Grossa, Paraná, Brasil.
É pequena –
Nunca serena.
*
Saio,
Não mais volto
Nem no coração
A mente da gente não sente,
Tente!
Inda que a alma se apresse
E, num dia, se aquiete.
*
Agora eu estou descendo e descendo e descendo e descendo
E chego ao fundo do Banhado dos Cogumelos
Da Princesa dos Campos Gerais,
Capital Cívica do Paraná.
Justo a tempo de perder de vez a pseudo eterna bola –
Pequena, serena e sensível a espinhos
Tento tanto no descido
Quanto no ido
Que, súbito, viro subido:
Ainda assim, minha bola resta realmente bela
E tão fera
Que se neste repente, no acaso ela de mim se solta
Ou me agarra a deixa
Acho no dobro que ela um dia volta.
*
Enfim, adeus:
*
Acontece que agora, 66 anos passados, é …
Minha bola, ela se trinca toda.
João, o Evangelista, meu irmão, também saído daquela bela mesma mãe, cabelos presos ao sobressalto,
Ao ouvir este meu canto,
Me confessa, em pranto, aqui em Brasília,
Uma ilha no interior de Goyas:
– Esta bola, pequena, serena e sensível a espinhos, Édio, é minha.
A tua, que pensas perdida,
Por mim foi trincada, machucada e arrebentada de vez
Porque a minha, também pequena, serena e sensível a espinhos,
Tu a perdeste nos cafundós daquele mesmo Banhado dos Campos Gerais
De onde eu, não tua lembrança, nunca embarquei na Saudade da Estação,
No trem que parece que não volta mas, quem sabe,
Contigo, talvez, nunca saiu,
Ou seja, por isso, queira voltar.
Portanto, eu continuo tentanto só no crescendo e andando e
No amando e armando,
A mando daquela bola
Sempre realmente bela
E sensível a espinhos.
Acontece que ela é tão fera
Mas tão fera, acima,
Que neste agora me confesso, abaixo, o seguinte, man@ :
– Talvez eu nunca mais te veja,
Sério.
Esta bola, para mim sempre tão linda,
Mesmo que pequena, serena e sensível a novos caminhos,
Mas agora, finalmente,
Fina,
A bola finda,
Embarca,
E só
Fico eu, aqui,
Cabelos presos ao sobressalto,
Sete da manhã,
Na Estação da Saudade toca a música,
Sempre a mesma.
Acontece que, desta vez, não acho nem mais a mim no meio da multidão de tantos eus:
E lá se vai o trem da minha vida
Assinado: MAMCASZ (Eduardo)
Sou brasileiro (polaco-baiano) natural do Paraná (Rio, Bahia, Porto Alegre), moro em Brasília (uma ilha no interior de Goiás).
Sempre um gigolô das palavras (jornalista, radialista, documentarista, ex-seminarista, niilista, poeta e blogueiro multimídia raivoso).
Assim é o meu Eu sustentado.
Nascido pobre de marré, no Sul Maravilha, nunca tenho quota e nem chego a presidente.
Uma vez só. Do Clube do Ócio, de poetas marginais.
Por isso eu me considero um sorteado pela vida, ainda que não pela loteria grande.
Então, não desanimo de lutar, em todos os sentidos, na estrada desta vívida vida vivida, partilhada com uma pessoa mais do que querida, amiga, porque sonho só é solidão.
Sexagenário e meio, não acho graça em furar fila ou ter vaga cativa ao estacionar, até porque continuo rodando.
Com muito gosto embarco sempre numa próxima viagem.
Desde que ela vá, que nem o livro no prelo, From Alaska to Jerusalem.
E por me considerar incompleto, confesso:
– Eu tenho tanto ainda que aprender.
Nota final:
Alguém sabe da minha bola pequena, serena e sensível a espinhos?
Se souber, comente abaixo.
Caso contrário, levanta-te e levita a vida neste trem ao contrário:
Your last atention, please, car@.
This blog in fact begins in december 1980 at the previous EBN – Brazilian News Enterprise, when I was president but dismissed by then President José Sarney (ah … the ghosts never die!).
My life with the National Radio begins even before I was born because my father through it, expeditionary square in Italy, World War II – sent messages to his fiancee, my future mother, both ghost for a long years.
This blog is a make-off from the book in late pregnancy that brings The Ghosts of the Radio Brazil, from the golden years, the 40s, to the deceased, which began with the suicide of Getúlio Vargas, the father of the poor people.
The people says it was a plague before he shooted in the chest, which initiated the collapse of National Radio, which would never have the golden years of the 40s.
And so, vou dar linha à pipa que o vento está a favor, as said to me my brother Tim Lopes, now ghost-mor of this blog, indeed the others fellows, good friends, or not.
Let’s go, man@.
Eduardo Mamcasz
Poet & Almost Zen
Inté e Axé!
agosto 15, 2013 at 11:28
Linda tua história! Mais ainda escrita assim de forma poética. Te admiro!
Abraços da parente! Simone
julho 27, 2013 at 12:46
Lindo. Tocou fundo em mim. A garra, a docura, a disponibilidade para a proxima viagem. Vc no Sul Maravilha, eu no Maranhao, trilhamos estradas parecidas. Obrigada por trazer de volta em mim emocoes tao boas. Grande abraco,Amalia
março 31, 2013 at 19:43
Gostei muito bom.
março 31, 2013 at 19:29
Mamcasz, se essa é a Maria Helena que estou pensando, nem estou acreditando… Eu me lembro de quando ela foi pra Portugal. Às vezes eu penso que é Espanha. Várias coisas fazem me lembrar dela. Sinto saudades.. Essa é a “nossa Maria Helena” do Globo, da segunda metade da década de 70?
Uau, aguardo a resposta!
março 31, 2013 at 18:08
Obrigado, Marilena.
março 31, 2013 at 18:02
Gostei. Descobri o blog, navegando sem rumo entre palavras como artista plastico, pintor, escritor e Brasilia como nucleo. Se fosse ler fechando os olhos, veria voce na minha frente. Igual. Creio que os anos nao passaram por ai. Seguro! abracinho da mhelena