Perto de casa, aqui mesmo na quadra, tem três mercados. Um, mais caro, muito usado no cartão corporativo nos tempos de Lula-Dilma. Outro, tão caro, mas com produtos bons. E, enfim, o mercado mais pobre, da turma das 400 – quem é de Brasília, sabe o que é isso. Bem no estilo carioca do subúrbio. Para mim, que já morei em Bonsucesso e na Tijuca, é o melhor dos três. É onde estamos agora.
Ao final das compras, na verdade quase nada, é mais pelo encontro, não tem mais sacola de plástico, cada qual com a sua bolsa debaixo do braço, na fila do caixa dos acima dos se senta – não, obrigado, senta você – chega o velho empregado que ajuda a embalar. Chega cantando, todo alegre. Cantando o que? Pois aqui começa a nossa prosa:

– Conheço esta música, meu amigo.
– É Cartola.
– Não.
Depois de várias jogadas, a fila da velhice, no mercado estilo subúrbio do Rio, afinal, os prédios de três andares, sem elevadores, nas 400, foram destinados aos empregados tipo ascensorista, faxineiro, contínuo e outros nobres obreiros que fizeram Brasília, mas sem direito a morar nos prédios das 100, 200 e 300 – todos com seis andares e oito elevadores, cada um.
– Bom, polaco, volte à prosa na fila dos velhos.
– Seguinte, gente. Ele está cantando uma música da Maria Bethânia.
Para que. Foi uma farra danada por parte dos velhos, senhoras e até duas senhoritas na fila porque são arrimo das avós presentes, alquebradas mas coerentes.
– Polaco sem vergonha. Conta outra.
– Posso falar?
– Um minuto!
– Nosso amigo aqui, auxiliar do mercado, gente fina, está cantando a música Loucura, do mestre gaúcho Lupicínio Rodrigues. A mesma música que eu estava ouvindo em casa, antes de escapar de Madame só para me encontrar com vocês aqui, e depois ali no botequim, pois então, a mesma música estava sendo cantada pela baiana Maria Bethânia.
Pronto. Recebo no ato o abraço da velhinha mais próxima, o sorriso da neta, e o reconhecimento do resto. A gerente, novinha, moreninha, a gracinha de nós velhos, só olhando, sorrindo, ela tem duas filhas pequenas, todos demos lembranças:
– Os tios não acham que está na hora de andar um pouco por aí?
– Sim, senhora!!!

No lado de fora, a conversa sobre Lupicínio Rodrigues continua, com a participação até do auxiliar do mercado, conhecido de todos, ajuda no carrinho até o apartamento das mais necessitadas e tudo. Pois todos trocamos informações, tais como:
1 – Discos completos só com músicas do mestre Lupicínio. Tem um da Adriana Calcanhoto, com 17 músicas. Outro com o Noite Ilustrada. Com Ayrton Montarroyos. Com o Roberto Menescal. A peça de teatro Vingança – o Musical, só com músicas do mestre dos pampas. Sem contar o disco Grandes Compositores – Lupicínio – Soft Orchestra.
– Chega, gente. Preciso ir.
– Ih. É mesmo.
– Tá com medo da Madame, Polaco? Volta …
– Ih. Esta música eu adoro na voz da Gal. Maior “Felicidade”, esta na voz do Caetano.
– Eu gosto da música do Lupicínio “Se acaso você chegasse”, na voz da Elza.
– Nervos de aço!
– Êpa, meu. Esta é do Paulinho da Viola.
– É o que você pensa, carioca vice de São Januário. Pois Nervos de Aço é do Lupicínio.

Foi assim. Até que cada velho, ou jovem senhora – somos educados – foi saindo, devagar, por suposto, mas todos cantando, cada qual a sua música predileta do grande Lupicínio.
Chego em casa, desta vez sem parar no boteco, mais do que atrasado, sabe como é…
– Estava onde, polaquinho?
– Agora não posso falar.
– Por causa de que?
– Alexia!!!
– Sim, meu polaco.
– Toque tudo do Lupicínio Rodrigues.
– “Se acaso você chegasse no meu chateaux
Encontrasse aquela mulher que você gostou.
Será que tinha coragem de trocar nossa amizade
Por ela, que já lhe abandonou?”
– Alexia!!!
– Quié?
– Muda!!!
E Madame:
– Acho bom!

Em Brasília, 08h54m desde 01/02/23. Ah. Este post vai para meu amigo de Alegrete, o gaúcho escritor e viajante, o Marçal Alves Leite. Com o adendo, velho gremista:
– A penúltima faixa do disco “Loucura”, da Adriana Calcanhoto, só com músicas do Lupi, pois então, a penúltima é justamente o Hino do Grêmio, escrito justo pelo Lupicínio Rodrigues.
“Até a pé nós iremos
Para o que der e vier
Mas o certo é que estaremos com o Grêmio
Onde ele estiver.”
Então tá, né.
Inté e Axé!!!